A legalização das mordomias

A legalização das mordomias


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O presidente-reeleito Lula e os profissionais da atividade política em geral ficam a dever ao presidente da Câmara e ex-presidente da República por um dia, o ilustre deputado Aldo Rebelo (PC


do B), a inestimável solução, absolutamente perfeita, para as muitas encrencas que passam pelos escândalos da corrupção, aterram no campo fofo da farra das mordomias e salpicam suspeições


sobre os casos de empreguismo e de outras lambanças que embaraçam e constrangem os donos e senhores do poder. A fórmula é a mais simples e óbvia, o ovo de Colombo à vista de todos no ninho


da esperteza. Candidato dissimulado à reeleição para a presidência da Câmara dos Deputados, o ex-ministro da Defesa decidiu dar o seu recado aos 512 eleitores com a demonstração de


competência, criatividade e da ousadia para desafiar os maledicentes. Como todo mundo com um mínimo de interesse sobre o que rola no governo e no Congresso está farto de saber, os senadores


e deputados, desde a mudança da capital do Rio para Brasília, no distante 21 de abril de 1960, cultivam a viçosa horta das mordomias, vantagens e benefícios que inflam os subsídios


parlamentares às nuvens de um dos melhores empregos do mundo. O monturo das regalias fura o teto da compostura. São 15 subsídios por ano, e mais R$ 15 mil da verba indenizatória mensal. E


mais a opção por R$ 3 mil por mês de auxílio moradia para os que não moram em Brasília e dispensam os apartamentos funcionais; quatro passagens aéreas mensais para o fim de semana nos


lençóis domésticos, a verba de gabinete de R$ 50,8 mil para a contratação de assessores e que fazem a festa dos cupinchas e mais verbas para selos, telefonemas, jornais, revistas e demais


penduricalhos. A paçoca indigesta desce pela goela treinada a deglutir a refeição parlamentar. Com a exceção da verba indenizatória, máscara que não cobria o vexame do disfarce de um salário


indireto, com o glacê da isenção do pagamento do imposto de renda. Ao cortar o nó com um golpe seco, o presidente Aldo Rebelo cunhou a fórmula que é um achado da inventividade no modelito


dos novos tempos: extinguiu a verba indenizatória e, no mesmo lance, aumentou os subsídios de R$ 12 mil com a equiparação aos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal Federal que, com o


tríplice reajuste providenciados durante a presidência do ministro Nélson Jobim saltitaram para R$ 24,5 mil mensais. Tacada de mestre usando a tabela: a verba indenizatória foi embutida no


subsídio e oficializada. Pelo mesmo atalho maroto, a Comissão Mista de Orçamento amoleceu as restrições das normas para a destinação dos recursos para as Organizações Não Governamentais


(ONGs), permitindo as emendas individuais de parlamentares para entidades controladas por parentes. A maliciosa reação do sub-relator da CPI dos Sanguessugas, deputado Fernando Gabeira


(PV-RJ), bota o dedo na ferida: a turma aprovou as mudanças porque "passou a pressão das eleições". E não se fala mais nisso. Em meio à trovoada, o presidente Lula parece que


recaiu na crise que irritação que o atormenta quando as coisas não saem como deseja. E aperta o passo na caminhada para ceder às pressões da ronda das ambições, com a anunciada antecipação


da partilha dos ministérios disponíveis para selar o acordo com o PMDB e outros aliados de menor calibre. Se levar avante o que informam as fontes palacianas de sempre, vamos conviver


durante um breve, mas excêntrico período, com dois ministérios: o atual, esvaziado com indicação do próximo substituto e o futuro, no limbo do risco de uma nova arrumação da casa em


desordem. Com duplo ministério, um fantasma e o outro na sala de espera, não é de estranhar que o vexaminoso sofrimento imposto com os atrasos de horas aos passageiros dos aviões não


encontre a solução da autoridade que se preza e da competência do Ministério da Defesa e demais responsáveis pela suspeita evidência de que milhões foram gastos nas reformas dos aeroportos e


ninguém cuidou da segurança do controle aéreo, herança do primeiro mandato que o herdeiro não sabe como resolver.