
Tributos: em águas turvas se pesca melhor
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Para não variar, investigações de organismos nacionais e internacionais nos colocam em vexaminosa contramão: para o relatório Latin Tax Index. do Latin Business Chronicle, elaborado com
dados do Banco Mundial, da KPMG e da Heritage Fondation, somos o "Inferno Fiscal Latino" e figuramos como o pior país para se pagar impostos entre os 183 pesquisados. São 2.600
horas de trabalho gastas por ano ou 108 dias apenas para que as empresas que se arriscam a produzir no Brasil cumpram com suas obrigações tributárias: interpretar normas, compilar
dados, preencher livros e formulários (físicos e eletrônicos), instalar sistemas, transmitir dados, responder notificações, emitir notas, prestar informações, elaborar recursos, reter
tributos de terceiros e pagar as próprias contribuições, taxas e impostos. Horas desperdiçadas, mal-gastas, porque improdutivas. É a maior terceirização de gestão tributária do mundo e o
custo de conformidade mais caro do planeta. Além disso, recente pesquisa do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), divulgada pelo caderno Justiça & Direito do jornal
Gazeta do Povo, calcula que foram criadas, em média, 30 normas tributárias por dia em nosso país desde a Constituição Federal de 1988. São 291 mil inovações fiscais e 14 reformas em pouco
mais de 20 anos. Dados espantosos que tornam evidente o quanto um modelo tributário mal concebido dificulta o desenvolvimento de nosso país, eleva o risco das atividades econômicas e
inferniza a vida dos contribuintes, criando contraestímulo produtivo e contraimpulso contributivo. É um modelo capaz de inibir investimentos e até de fechar empresas. Alguns contribuintes,
sejam autônomos ou empresários, costumam ver-se na contingência de "planejar sem mapas" suas atividades, realizar "apostas interpretativas" em matéria de tributos, sob
pena de não se mostrarem em condições de oferecer competitivamente seus produtos ou serviço. Muitas vezes, advogados, consultores ou contadores mesmos os que são adequadamente preparados
pouco podem fazer pelo seu cliente. Ademais disso, do ponto de vista dos consumidores, o princípio da transparência fiscal jaz na cripta da obscuridade, na exata medida em que o elementar
preceito constitucional que obriga o esclarecimento sobre a carga fiscal incidente sobre os produtos e serviços é olimpicamente desconsiderado. De fato, as normas são inconstantes, a
jurisprudência é vacilante, os tribunais administrativos e judiciais adquiriram o hábito de mudar de posição com as estações do ano. E quem paga a conta dos inevitáveis equívocos? O
contribuinte não tem o direito de errar. Todo erro será castigado, toda falha será punida, não há espaço para a fiscalização orientativa, apenas para a ação punitiva. Multas de 75%, 100% e
150% (inadmissíveis em qualquer contrato privado) são comuns para a fazenda pública alguns municípios chegam a cobrar 500%. Regras que fazem pouco da razoabilidade e da proporcionalidade
e, antes de induzir o respeito às normas, desmoralizam o sistema. O próprio TRF da 4ª Região reconheceu, recentemente, os problemas que decorrem do nosso emaranhado tributário, ao julgar
inconstitucional a perversa multa aplicada pela Receita Federal aos pedidos de ressarcimento tributário indevido. Disse o tribunal que a complexidade e subjetividade das inúmeras normas
tributárias dificultam a melhor interpretação do direito, "gerando conflitos de entendimentos do próprio Fisco e do Judiciário com seus respectivos órgãos julgadores". E arremata:
"não há negar a miríade de leis, medidas provisórias, decretos e outros atos normativos infralegais que tisnam a clareza do sistema normativo tributário brasileiro". (TRF4, AC N.º
5011570-91.2011.404.7200/SC, voto do Des. Otavio Roberto Pamplona, proferido em 13/04/2012). Ou seja, a obscuridade promove a ilegalidade e instila a injustiça tributária. Aliás, a percepção
de iniquidade se traduz nas noções correntes, segundo as quais "é impossível cumprir com todas as obrigações tributárias"; "a fiscalização sempre vai encontrar algum erro em
sua contabilidade" e "por melhor que você faça, ainda assim será autuado". E, de fato, é o que invariavelmente ocorre. Mas, afinal, a quem interessa tanta insegurança e
obscuridade no campo tributário? A julgar pelos expressivos números da arrecadação tributária brasileira, parece que aqui no Brasil se aplica o ditado espanhol, segundo o qual, "em
águas turvas se pesca melhor".