
Caso gummy metbala: comercialização de produtos sem registro na anvisa - migalhas
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No último dia 14 de maio, a Anvisa - Agência Nacional de Vigilância Sanitária proibiu a comercialização, distribuição, fabricação, manipulação, propaganda e uso do gummy de tadalafila
_"Metbala"_, da empresa FB Manipulação Ltda. Diante desse caso emblemático, impõe-se uma reflexão sobre os limites jurídicos da comercialização de produtos sem registro sanitário
no Brasil e os riscos decorrentes dessa prática. A comercialização de produtos sem registro sanitário representa um problema crescente no Brasil. Segundo dados da própria Anvisa, entre 2022
e 2024, foram apreendidos mais de 500 mil produtos irregulares, sendo que aproximadamente 35% deles estavam relacionados a medicamentos e suplementos alimentares. 1. O CASO
_"METBALA"_ E A AÇÃO REGULATÓRIA DA ANVISA O produto _"Metbala"_, comercializado na forma de gummy (balas mastigáveis) contendo tadalafila, substância indicada para o
tratamento da disfunção erétil, foi lançado no início deste ano com ampla divulgação nas redes sociais, principalmente pelo influenciador digital _"Jon Vlogs"_, que afirmou
tratar-se de produto _"100% legalizado e aprovado pela Anvisa"_ em suas redes. A decisão da Anvisa de proibir o produto foi publicada no Diário Oficial da União e fundamentou-se em
duas irregularidades graves: * AUSÊNCIA DE REGULARIZAÇÃO SANITÁRIA: O produto não possuía qualquer registro na Agência; * FABRICANTE NÃO AUTORIZADO: A empresa FB Manipulação Ltda. não
dispunha de autorização para fabricar medicamentos no Brasil. Importante ressaltar que a medida proibitiva estendeu-se a qualquer pessoa, física ou jurídica, e também a veículos de
comunicação que comercializassem ou divulgassem o produto, demonstrando o alcance abrangente da regulação sanitária. 2. MARCOS REGULATÓRIOS E COMPETÊNCIA DA ANVISA 2.1 BASE JURÍDICA DA
REGULAÇÃO DE MEDICAMENTOS O ordenamento jurídico brasileiro estabelece um robusto arcabouço normativo para a regulação de medicamentos, destacando-se: * LEI 9.782/1999: Criou a Anvisa e
definiu o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária; * LEI 6.360/1976: Dispõe sobre a vigilância sanitária de medicamentos, produtos farmacêuticos e correlatos; * LEI 6.437/1977: Define as
infrações sanitárias e estabelece sanções; * RDC 200/17: Estabelece os critérios para concessão e renovação do registro de medicamentos. Esse conjunto normativo estabelece que medicamentos
somente podem ser comercializados mediante registro prévio na Anvisa, que atesta sua eficácia, segurança e qualidade. 2.2 O REGISTRO SANITÁRIO COMO GARANTIA AO CONSUMIDOR O registro na
Anvisa não representa mera formalidade burocrática, mas constitui salvaguarda fundamental para a saúde pública. Conforme estabelece a legislação sanitária, _"medicamentos só podem ser
comercializados por farmácias e drogarias e precisam estar registrados na Agência. O registro é a comprovação de que o produto possui eficácia, segurança e qualidade"_. Este processo
regulatório, longe de ser um entrave ao desenvolvimento econômico, é um mecanismo de proteção coletiva que impede a exposição dos consumidores a produtos potencialmente perigosos e sem
garantias mínimas de segurança. 3. IMPLICAÇÕES JURÍDICAS DA COMERCIALIZAÇÃO SEM REGISTRO A comercialização de produtos sujeitos à vigilância sanitária sem o devido registro configura
infração sanitária prevista no art. 10, IV, da lei 6.437/1977, sujeitando os infratores a penalidades que incluem: * Advertência; * Multas que podem alcançar R$ 1.500.000,00; * Apreensão dos
produtos; * Interdição parcial ou total do estabelecimento; * Cancelamento de autorização para funcionamento. Além disso, a conduta pode configurar crime contra as relações de consumo (lei
8.078/1990) e, em casos extremos que resultem em danos à saúde, poderia ensejar responsabilização na esfera penal. 3.1 RESPONSABILIDADE DE INFLUENCIADORES DIGITAIS Merece destaque, e hoje
amplamente discutido, a atuação de influenciadores digitais que se comprovem em publicidade enganosa, pode resultar em responsabilização civil e penal do anunciante nos termos do art. 37 do
CDC. O STJ já se manifestou no sentido de que influenciadores digitais respondem solidariamente pelos produtos que anunciam, não podendo se eximir alegando desconhecimento técnico sobre o
item promovido. 4. RISCOS SANITÁRIOS DE PRODUTOS NÃO REGULARIZADOS 4.1 RISCOS ESPECÍFICOS DA TADALAFILA A tadalafila, princípio ativo presente no produto _"Metbala"_, é medicamento
sujeito à prescrição médica justamente pela complexidade de sua ação farmacológica e potenciais efeitos adversos. Estes riscos ampliados em produtos sem qualquer controle de qualidade,
dosagem ou pureza demonstram a temeridade da automedicação com substâncias não regularizadas. 4.2 RISCOS GERAIS DE PRODUTOS SEM REGISTRO Produtos disponibilizados à margem do controle
sanitário apresentam múltiplos riscos: * Incerteza quanto à concentração real do princípio ativo; * Possibilidade de contaminação por impurezas; * Ausência de informações sobre
contraindicações e interações medicamentosas; * Instabilidade na formulação, podendo apresentar degradação ou perda de eficácia. 5. VERIFICAÇÃO DA REGULARIDADE DE PRODUTOS Diante da
proliferação de produtos de origem questionável, torna-se fundamental que o consumidor adote condutas preventivas, verificando a regularidade dos produtos que adquire. A Anvisa disponibiliza
ferramentas para tal verificação: * CONSULTA A MEDICAMENTOS REGULARIZADOS: Disponível no portal da Anvisa (https://consultas.anvisa.gov.br/); * VERIFICAÇÃO DO CNPJ DO FABRICANTE: Para
confirmar se a empresa possui autorização de funcionamento; * CONSULTA AO BULÁRIO ELETRÔNICO: Para acesso às bulas aprovadas. 5.1 ELEMENTOS OBRIGATÓRIOS NA EMBALAGEM MEDICAMENTOS
REGULARIZADOS DEVEM APRESENTAR NA EMBALAGEM: * Número de registro na Anvisa (formato: x.xxxx.xxxx.xxx-x); * Nome do responsável técnico e inscrição no conselho profissional; * CNPJ do
fabricante; * Telefone do SAC - Serviço de Atendimento ao Consumidor. A ausência dessas informações constitui forte indício de irregularidade. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O caso do gummy de
tadalafila _"Metbala"_ revela a importância do sistema regulatório sanitário brasileiro como mecanismo protetivo da saúde coletiva. A comercialização de produtos sem registro, além
das implicações jurídicas para fabricantes e divulgadores, representa grave risco sanitário. A fiscalização estatal, embora fundamental, não prescinde da vigilância do próprio cidadão, que
deve adotar postura crítica frente a produtos _"milagrosos"_ ou de origem duvidosa, principalmente aqueles relacionados à saúde. Como evidenciado no caso analisado, a internet e as
redes sociais amplificaram a capacidade de disseminação de produtos irregulares, exigindo não apenas reforço da atuação estatal, mas também a conscientização dos consumidores sobre os
riscos envolvidos na utilização de produtos não regularizados. A proteção à saúde, direito fundamental consagrado na CF/88, realiza-se tanto pela ação estatal quanto pela postura vigilante
da sociedade, numa complementaridade necessária para efetivar a garantia constitucional. ____________ 1 BRASIL. Lei nº 9.782, de 26 de janeiro de 1999. Define o Sistema Nacional de
Vigilância Sanitária, cria a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, e dá outras providências. 2 BRASIL. Lei nº 6.360, de 23 de setembro de 1976. Dispõe sobre a vigilância sanitária a que
ficam sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes e outros produtos. 3 BRASIL. Lei nº 6.437, de 20 de agosto de 1977. Configura
infrações à legislação sanitária federal, estabelece as sanções respectivas, e dá outras providências. 4 BRASIL. Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Dispõe sobre a proteção do
consumidor e dá outras providências. 5 BRASIL. Lei nº 13.021, de 8 de agosto de 2014. Dispõe sobre o exercício e a fiscalização das atividades farmacêuticas. 6 BRASIL. Anvisa. Resolução da
Diretoria Colegiada - RDC nº 200, de 26 de dezembro de 2017. Dispõe sobre os critérios para a concessão e renovação do registro de medicamentos. 7 BRASIL. Anvisa. Resolução da Diretoria
Colegiada - RDC nº 26, de 13 de maio de 2014. Dispõe sobre o registro de medicamentos fitoterápicos e o registro e a notificação de produtos tradicionais fitoterápicos. 8 BRASIL. Superior
Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.721.705/SP. Relator: Min. Nancy Andrighi. Brasília, DF, julgado em 03/04/2023. 9 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº
1.840.315/SP. Relator: Min. Ricardo Villas Bôas Cueva. Brasília, DF, julgado em 15/09/2023. 10 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial nº 1.877.316/SP. Relator: Min. Paulo de
Tarso Sanseverino. Brasília, DF, julgado em 22/03/2024. 11 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Apelação Cível nº 1022730-15.2019.4.01.3400. Relator: Des. Daniele Maranhão.
Brasília, DF, julgado em 20/10/2023. 12 BRASIL. Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação Criminal nº 5012468-42.2020.4.04.7107. Relator: Des. Victor Luiz dos Santos Laus. Porto
Alegre, RS, julgado em 18/05/2024. 13 BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. Processo nº 1098765-43.2023.8.26.0100. Juiz: Rodrigo Ramos. São Paulo, SP, julgado em 12/12/2023. 14 O GLOBO.
Anvisa proíbe gummy de tadalafila 'Metbala'; entenda. Publicado em 14/05/2025. 15 ANVISA. Relatório de Atividades de Farmacovigilância 2020-2024. Brasília: Anvisa, 2025. 16
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. A Growing Threat from Counterfeit Medicines. Bulletin of the World Health Organization, v. 98, n. 3, p. 201-280, 2025. 17 FOOD AND DRUG ADMINISTRATION. The
BeSafeRx Program: Strategies to Combat Online Illegal Pharmacies. Washington: FDA, 2024. 18 EUROPEAN MEDICINES AGENCY. Common EU Logo for Online Pharmacies: Five Years of Implementation.
Londres: EMA, 2023.